Ads 468x60px

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Desventuras da dona de uma cachorra inteligente - Cap. 01

    Pois é! Milagres acontecem, e medos desaparecem. Era uma vez uma menininha mimada que morria de medo de cachorros... E essa história poderia acabar com uma vida mais ou menos saudável e feliz, longe dos bichinhos peludos, conhecidos por serem os melhores amigos do homem. Mas, em algum lugar do passado houve o Donnie (desculpem, não tenho foto digital do meu cachorro)!!! Poderíamos estar falando do cantor e ator, membro fundador e líder da BoyBand New Kids on the Block. E seria uma benção se fosse ele. Mas estamos falando de Donnie Dog, companheiro de quatro patas desta que vos escreve. 
    Eu tinha por volta de quinze anos quando meus pais se separaram. E eu escolhi ficar com meu pai. Pouco antes do ocorrido, minha mãe, já sabendo o que ia acontecer, pegou um dos cachorrinhos criados por minha tia, um Yorkshire. Ele já tinha quase um ano quando veio morar conosco, e tinha um nome: Júnior! O que muitos dos leitores não sabem é que sou teimosa, voluntariosa, cheia de vontades e amo música. E, aos quinze anos, eu era apaixonada por Donnie Wahlberg, líder do New Kids on the Block (já citado). Então, depois de discutir nomes com minha melhor amiga na época, chegamos à conclusão que ele deveria carregar  a alcunha de nosso herói. Eu queria Mark (Wahlberg), na verdade. Mas minha amiga me convenceu que Donnie seria melhor. 
    E ela estava certa. O nome caiu como uma luva para o bichinho, pois ele era a estrela do nosso show. Muito engraçadinho, brincalhão, companheiro e, por vezes, encrenqueiro. Meu pai, muito rígido com as coisas, me fez prometer que eu iria cuidar de todos os assuntos pertinentes ao cachorro, sob a pena de tê-lo enviado de volta para a minha tia, caso eu não o fizesse. E eis outro pormenor de minha vida particular: meu pai cumpria as promessas dele! Então não havia como não obedecer. Eu penei na mão do Donnie!!! 
    Acontece que eu estudava o dia todo, e meus pais trabalhavam. O cachorro (poi é) ficava sozinho em casa, e tinha aí bem umas 8 horas para aprontar de tudo. O clássico cocô no bumbum, o menos clássico caminho de cocô no carpete, o inusitado agasalho mastigado, e o acolchoado namorado também. Fui clara? No fim da tarde, ao chegar da escola, eu tinha um ritual: cortar o excesso de pelo em volta do bumbum dele, limpar a eventual sujeira fisiológica grudada lá, esfregar o carpete com vinagre (todo ele, pois Donnie caprichava na bagunça), e esconder quaisquer outras provas de crimes cometidos pelo indivíduo, antes que meu pai chegasse. 
    Em troca, Donnie me recebia com festa sempre que eu abria a porta, escondia seus pertences na minha cama, tornando a hora de dormir um evento, brincava com meu pai, e supria as carências da minha mãe. Enfim, fazia a casa funcionar com mais leveza, mesmo durante a crise que passávamos. Ele só não conseguiu evitar a separação dos meus pais!
    Minha mãe foi quem saiu de casa. Eu fiquei com meu pai, no mesmo apartamento. E Donnie! Por que ele tinha sido um prêmio de consolação, na verdade. E como ele serviu ao seu propósito! Em poucos meses eu já nem lembrava que tinha medo de cachorros. Continuava sendo cautelosa com aqueles que eu não conhecia. Mas já não fugia de nenhum. Por que Donnie me mostrou como tratá-los, e estava sempre lá para me defender. E era bravo o meu bichinho. O que tinha de pequeno, tinha de valente. 
    Foi sua valentia que o tirou de mim. Ele estava conosco a menos de um ano, quando foi atropelado. Era domingo, voltávamos de Sorocaba, se não me engano. Donnie tinha passado o dia trancado no carro, por que os cachorrinhos da minha prima estavam com pulgas, e eu não quis que ele fosse exposto a isso. Já havíamos tido muito trabalho algum tempo antes, com as pulgas do Parque Ibirapuera. Eu acabei ficando boa parte do tempo no carro com ele, ao invés de brincar na chácara do meu tio. Estávamos cansados e com calor. Ao descer do carro, na garagem, peguei a coleira do Donnie. Ia colocar nele, para poder conduzi-lo à porta do prédio (nossa garagem fica no terreno ao lado), mas o danado viu um cocker do outro lado da rua, e pulou por sobre meu braço para ir tirar satisfações. Meu pai estava descarregando o carro, e acho que Donnie pensou que o cocker era uma ameaça. Correu latindo pela rua, e foi atropelado no meio do caminho por um carro em alta velocidade (no domingo!). 
    O dono do cocker não parou, o carro não parou. Foi uma das cenas mais tristes da minha vida. Ver o sangue do meu bichinho escorrendo pelo asfalto. O vizinho (que era um menino também) correu para tentar socorrê-lo, e meu pai foi logo em seguida. Eu só chorava e xingava o maldito motorista que não parou nem para socorrer meu amiguinho. Até respiração boca-a-boca e massagem cardíaca ele recebeu. Foi a primeira vez que vi meu pai em ação, como médico. Nunca o vi salvando nenhuma pessoa (por que não ficava circulando de graça no serviço dele); mas o vi abrindo a boquinha do cachorro e soprando, e massageando o peito do bichinho com os dedos, para ver se o recuperava. Tudo em vão...
    Mas a vida do meu bichinho não foi. Em oito meses (mais ou menos o tempo que tivemos juntos) aprendi a amar os animais, respeitá-los e entendê-los. Aprendi que eles precisam de atenção e cuidados. Aprendi a dar e receber amor de graça. Vi meu pai ficar triste de verdade por alguma coisa. Meu pai não costuma demonstrar sentimentos. Aprendi que algumas dores na vida nunca passam. E que não há problemas nisso. Apenas significa que o amei de verdade. 
    Minha mãe teve alguns cachorros depois disso. Eu a visitava nos fins de semana, então me sentia um pouco dona dos cachorros também. E sentia a dor da separação quando ela os doava. Mas, eu não imaginei o que viria dez anos depois. Eu estava terminando a faculdade, e meu pai se mudou para o interior. Foi quando eu tive que ir morar com a minha mãe. E aí ela se sentiu confortável com a possibilidade de comprar uma cachorrinha. Afinal de contas, eu estaria lá para cuidar da nova vida. É que minha mãe era enfermeira, e dava plantões longos em hospitais. Ela adorava cachorros, e durante os dez anos depois do Donnie, teve vários. Ela os pegava, ficava um tempo com eles, e depois os doava, por que começava a sentir pena dos bichinhos, que ficavam muito sozinhos por conta do trabalho dela. Essa era a minha mãe. Sentimental!!! Puxei pra ela! Hehe

A mais tinhosa cachorra do mundo!!!

    Desta vez ia dar certo. Ela iria trabalhar, mas eu estaria lá pra fazer companhia pro novo bichinho. E eis que veio Candy! Ah, é, eu dei o nome. E tem relação com música também. E foi amor a primeira vista. Meu algodãozinho. Era tão engraçadinha. E esperta (acreditem, não é uma boa coisa). E me escolheu logo de cara. Diferente do Donnie, que era mais ligado ao meu pai. Candy era um grude comigo. Ela é, na verdade!!! Hehe
    Eu pedi pra minha mãe educar direitinho, na base do portãozinho na área de serviço. Cachorro de um lado, humanos de outro. Tentei ser rígida e dar modos pra ela desde o início, pra não sofrer o que eu sofri com o outro. Não queria passar tardes esfregando o chão de novo. Mas minha mãe tinha outros planos. Esperava sempre que eu dormisse, e ia lá na caminha da Candy, na área de serviço. Pegava a cachorra e a levava para a cama. No começo eu nem me dei conta. A cama da minha mãe era alta, a bichinha não conseguia descer. Mas não demorou muito pra eu perceber o que estava acontecendo. 
    Eu gostava demais da Candy. E passei a me preocupar com o bem estar dela. Meu medo era que minha mãe, dormindo, rolasse por sobre ela e a esmagasse. Ela era (é) tão pequenininha. E a minha paz acabou aí! Por que eu não dormia direito. Ficava ligada na respiração da cachorra. Se ela parasse de fazer barulho, eu corria para socorrê-la. E não deu outra, num desses dias eu não a ouvi respirando, e corri para ver o que acontecia. Tirei-a de debaixo das pernas da minha mãe, e a coloquei no meu ombro, para conduzi-la para sua caminha. E aí vieram os beijos (lambidas) e as mordidinhas na orelha, e a lamúria quando tentei colocá-la no chão. Era tão fofinha! Pensei: só uma noite! 
    Pois é... Algum tempo depois a danada aprendeu a descer sozinha da cama da minha mãe. E era(é) esperta! Esperava que ela caísse no sono e só então descia, e se aboletava na minha cama. Eu, já aconchegada, não queria me dar ao trabalho de levantar e colocá-la na área. E assim, dia após dia, ela foi ficando. Roubando cobertor no inverno, ocupando espaços (por que a bichinha é espaçosa), e fazendo das minhas noites uma aventura. Por que agora eu tinha que me preocupar em não quebrar a bichinha com o MEU peso. 
    A medida que o tempo ia passando, as histórias engraçadas iam se acumulando (e vou contá-las nas crônicas), Candy cresceu um pouquinho (não muito), minha mãe faleceu, eu a herdei, e perdi de vez minha privacidade. Por que a Candy manda em mim! Já são nove anos da relação mais estável da minha vida. 
    E se Donnie me ensinou a amar de graça, Candy me ensinou a amar na adversidade. Mesmo quando seu cachorro é tão esperto que te tem exatamente onde ele quer o tempo todo! Lembrem-se: cachorros espertos não são uma vantagem! A não ser para ensiná-los a atravessar a rua só com você, para evitar ver mais sangue derramado no asfalto! Juntas há nove anos, eu rezo todos os dias para que haja pelo menos mais uns dez, por que ela me persegue, me irrita, me ludibria com a carinha fofa dela, e faz de mim o que bem quer; mas também é ela quem enxuga minhas lágrimas, chora quando eu me afasto, me consola quando estou nervosa e torna cada manhã da minha vida, até as mais sombrias, um pouco mais doce com seu carinho. Como não amar essa bichinha?




JulyN

0 comentários:

Postar um comentário